segunda-feira, 16 de março de 2015

Épico. Ou típico.

A semana passada fui quebrar o galho lá na empresa da família. Desta vez sem ajudas. Só eu e aquele escritório, que me viu crescer e que me vê constantemente fugir dele (não nasci para aquilo!). Entre estantes cheias de dossiers com processos, telefones a tocar, folhas, panfletos publicitários e afins, a cereja no topo do bolo: primeiro cliente.   
Lá entrou o senhor, com os seus 70 e picos, de bengalita, óculos fundo de garrafa e uma data de papéis na mão. Respirei fundo. E a cena foi a seguinte:

Eu: Boa tarde, em que posso ajudar?
O sr: Boa tarde, menina. Desculpe perguntar, é que eu vejo mal, mas estou na AC?
Eu: Sim, o senhor está na AC. Mas porque pergunta? Não era aqui que queria vir?
O sr: Era, menina. Mas como lhe estava a dizer, a menina não é a mesma que cá costuma estar... Então podia-me ter enganado, sabe. Isto a idade já não perdoa.
Eu: Pois, compreendo. De facto não sou a menina que costuma atendê-lo. Sou a sobrinha. Mas pode na mesma tratar as coisas comigo, não se preocupe. Em que posso ajudá-lo?
O sr: Vinha-lhe cá deixar estes papeis, menina... Tome lá.

(entretanto deixa cair um monte de notas no chão)

Eu: Então mostre-me cá o que aí traz para ver no que posso ajudar.

Lá me deu os ditos papeis, e qual o meu espanto quando:
- Nada tinham a ver com os assuntos que se podem tratar lá na empresa;
- Eram documentos do século passado, ainda escritos naquelas famosas máquinas de escrever, todos velhinhos;
- E aquele senhor era afinal um dos "nossos" clientes mais antigos e que, de facto, nos últimos tempos aparece lá frequentemente com os mesmos papeis e com a mesma conversa;

Espreitei para os post-it dos avisos e lá estava um sublinhado a vermelho que dizia: "Quando o sr João vier trazer o papeis de sempre, o procedimento é o seguinte: fotocopiar e arquivar. O sr sofre de Alzheimer."

Respirei de alívio. Ao menos ia fazer uma coisa bem feita! Então lá fiz a "brincadeira" para o senhor não se sentir confuso e nervoso. Lá peguei eu nos papeis, fotocopiei-os, arquivei-os no dossier que tinha o seu nome e lá lhe disse:

- Senhor João, da minha parte está tudo. Pode ir descansado que nós tratamos disto. Tenha uma boa tarde, sim?

E lá me deu um aperto de mão, disse um "Obrigado, menina!" todo contente, deu-me 10 cêntimos de gorjeta e foi à sua vida. 



E o resto do dia, meus amigos, não foi pêra doce, não! Definitivamente, não nasci para o negócio da família... 





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